Há anos sem dar entrevistas, o empresário Nelson Tanure, dono da Cia Docas e da Companhia Brasileira de Multimídia, entre outras organizações, aceitou falar com exclusividade para Protagonistas, na quarta entrevista da série (antes dele, foram entrevistados Otávio Frias Filho, Mino Carta e Domingo Alzugaray). Numa conversa de quase quatro horas com o editor Eduardo Ribeiro, ele falou de seus planos, de suas brigas, de seus desafetos, de sua visão de mídia, de sua personalidade, de investimentos, de ações trabalhistas e do legado que pretende deixar para as próximas gerações.
Desde que desembarcou na mídia, cinco anos atrás, assumindo o controle do então insolvente Jornal do Brasil, Nelson Tanure transformou-se numa das mais polêmicas figuras da mídia brasileira. Dele tudo se fala: que é arrogante e predador, que está atrás apenas de bons e lucrativos negócios, que compra empresas quebradas para tirar proveito da situação sem necessariamente reerguê-las, que não tem qualquer compromisso com a ética e com o jornalismo, que é frio e calculista nas ações empreendidas e vingativo com os desafetos, que cultiva e se aproveita das boas relações com a Justiça e com o Poder. Um perfil, enfim, nada lisonjeiro, sobretudo para quem, como ele, cultiva a discrição e o isolamento.
Parte desta “fama” ele construiu, de certo modo, pela turbulenta agenda trabalhista que acabou sendo obrigado a montar ao adquirir o controle do Jornal do Brasil. Agenda que, por sinal, cresceu substancialmente com a segunda aquisição feita pela sua Companhia Brasileira de Multimídia: o jornal Gazeta Mercantil, que, do mesmo modo que o JB, estava em situação pré-falimentar. No pico, ele e seu staff chegaram a enfrentar mais de 4 mil ações trabalhistas e hoje, centenas de audiências depois, ainda se defronta com perto de 600 delas, em todo o País.
Acusado de não dar vida fácil aos desafetos, também ele enfrenta duros e constantes ataques. Na sua defesa, diz que nunca atacou quem quer que seja, apenas reagiu às agressões sofridas. De todo modo, tem hoje contra si, por exemplo, os dois maiores sindicatos de jornalistas do País (São Paulo e Rio de Janeiro), a própria Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, a Associação dos Crededores da Gazeta Mercantil e, obviamente, a concorrência. De quebra, ainda enfrenta a recorrente desconfiança sobre suas reais intenções no mercado jornalístico. “Vim para ficar. Os jornais e as empresas estão hoje recuperados, a operação voltou a ser lucrativa e a credibilidade está voltando. E os investimentos não vão parar” – afirma, na sua defesa, rebatendo as críticas feitas, inclusive na questão chave que é a da credibilidade.
A seu favor, estão aí, vivos, os próprios veículos, que não sobreviveriam a duas primaveras nas mãos do empresário, conforme muito se falou. As equipes minguaram, é verdade, com a demissão de centenas de profissionais. Ainda assim, os dois jornais e mais a revista Forbes contam hoje com uma equipe de 350 jornalistas. “Um belíssimo número” – diz, lembrando que um dia, no passado, a Gazeta Mercantil era tão megalomaníaca que chegou a ter uma redação maior do que a do New York Times .
Tanure nega uma a uma todas as acusações que lhe são feitas. Diz que são, na essência, superficiais e feitas por quem não conhece de perto as operações e ele. Mostra-se conformado com o que chama de ingratidão das pessoas, e garante que seu sonho não é, como muitos afirmam, construir um império de comunicação, mas sim deixar como legado para as futuras gerações essas duas verdadeiras instituições que são o Jornal do Brasil e a Gazeta Mercantil. “Não sou dono de nada. Essas marcas nos transcendem. Nós vamos passar e elas permanecerão” – assegura.
Natural de Salvador, onde nasceu em 1951, filho de pai espanhol e mãe brasileira, Tanure deixou a Bahia em 1977, aos 25 anos de idade, já formado em Administração de Empresas e dominando com fluência os idiomas francês e inglês. Chegou a morar por seis meses, em 1975, na França, e depois, já casado, nos Estados Unidos, em meados dos anos 90. Deu os primeiros passos profissionais ao lado do pai, José Sequeiros, numa empresa do setor imobiliário – a Cinasa -, ainda na Bahia, mas seu vôo empresarial começou a se desenhar efetivamente no Rio de Janeiro, a partir da aquisição da Sequip, em fins da década de 70. De lá para cá, estiveram sob seu controle Sade (equipamentos industriais), Verolme Ishibrás (construção naval), Cia Docas (operação portuária) e, desde o ano 2000, a Editora JB.
Em seu escritório da Cia Docas, no Rio de Janeiro, no Centro Empresarial do bairro de Botafogo, ao lado do vice-presidente de Conteúdo, Marcos Troyjo, ele recebeu o editor Eduardo Ribeiro. E falou durante quase quatro horas sobre vários dos assuntos que o têm marcado nessa trajetória, incluindo o recente episódio que o colocou em confronto direto com o Estadão, no qual, sentindo-se caluniado por matérias produzidas pelos repórteres Lourival Sant’Anna e Alberto Komatsu (este da sucursal Rio), não só acionou a Justiça, como partiu para o troco, publicando, tanto no Jornal do Brasil quanto na Gazeta Mercantil, matérias nas quais do mesmo modo ataca a honra de ambos. “As matérias do Estadão contêm uma série de mentiras, as nossas só trabalham com fatos, não com suposições – diz novamente na sua defesa, até certo ponto ignorando o estrago dessas atitudes na imagem pela qual tanto zela e que quer melhorar.
Com as matérias, diga-se de passagem, conseguiu o contrário. A Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj, por exemplo, soltou no último dia 25 de janeiro um Manifesto de Solidariedade e Desagravo aos jornalistas atacados e/ou processados por Tanure, que em menos de dois dias já havia reunido mais de 500 assinaturas.
Manifestações como essa, no entanto, não são novidades na vida desse empresário que “saiu do Nordeste para vencer no Sul, mesmo enfrentando todo tipo de preconceito”, como diz. Só nesses inco anos de mídia já enfrentou passeatas, atos públicos, ameaças de greve, para ficar apenas nos episódios mais visíveis.
Tranqüilo e cordial, na conversa com Protagonistas, ficou, na maior parte do tempo, de costas para o belo cartão postal que se vê da janela de seu escritório: a paisagem da Praia de Botafogo, com o Pão de Açúcar em meio a nuvens, barcos e mar.
A sopa que sorveu no início da entrevista, quando o almoço foi servido, fez com que fosse tomado de um calor excessivo, o mesmo calor que por vezes ressurgiu ao longo da conversa, quando o assunto resvalava para os chamados crimes contra a honra. Mesmo mantendo a tranqüilidade, nesses momentos ele demonstrava toda a sua irritação contra os desafetos, valendo-se, inclusive, de palavras que muito lembram o chamado linguajar policial. “O que vou dizer para os meus filhos, para a minha família, para os meus amigos, depois dessas matérias publicadas pelo Estadão, com uma série de mentiras a meu respeito?” – questiona, indignado com o que considera um ataque à sua honra.
Dizendo-se cristão e fervoroso defensor do diálogo, do entendimento, ele garante que só não aceita dialogar com quem o ataca. “Não ajo nunca contra ninguém, mas se sou atacado reajo muitas vezes de forma desmesurada”, admite, reconhecendo ser este um defeito. “Só merece misericórdia quem misericordioso é” – completa, dando mostras de que tem nos textos e pensamentos bíblicos fonte permanente de reflexão e inspiração.
Os contra-ataques desferidos sobretudo sobre o repórter especial do Estadão, Lourival Sant’Anna, e em menor grau contra o repórter da sucursal Rio, do jornal, Alberto Komatsu, no entanto, não mostram essa face cristã que Tanure professa. Os dois jornais que dirige (ele diz que não interfere nas redações e nas pautas) decidiram abrir as baterias contra Sant’Anna, de um lado tentando associar seu nome às patifarias de Pimenta Neves, e, de outro, desqualificando projetos no qual ele esteve envolvido (livros, cursos etc.).
Se considera que o Estadão errou, Tanure também erra ao dar o troco dessa forma, querendo pagar na mesma moeda. Protagonistas, por exemplo, a propósito da insinuação de que Lourival foi uma espécie de cúmplice de Pimenta Neves, no assassinato de Sandra Gomide, foi conferir com um graduado profissional que acompanhou de perto todo o episódio e dele obteve, com a condição de que seu nome fosse preservado, o seguinte depoimento:
“O Lourival era o editor-chefe do Estadão quando o Pimenta assassinou a Sandra Gomide. Naquele domingo fatídico, Lourival estava em Atlanta, nos Estados Unidos, de férias. Ficou sabendo dois ou três dias depois. Ligou para o Dr. Ruy Mesquita perguntando se queria que ele voltasse e foi aconselhado a manter as férias, tendo em vista que pouco adiantaria o seu retorno. Quando o Lourival voltou, a crise já estava contornada. Pimenta nunca ligou na redação perguntando ou procurando pelo Lourival, pois sabia que ele não tinha voltado. Ele ligava e saía falando a esmo com quem atendesse o telefone. Estava desnorteado. O Lourival era da confiança do Pimenta mas não era amigo íntimo dele. Além de tudo, é super bom caráter e não merece esse tratamento.”
Tanure também não perdoa Aziz Filho, presidente do Sindicato do Município do Rio e atual chefe de Redação da sucursal da IstoÉ, no Rio, a quem responsabiliza diretamente por inúmeras manifestações feitas contra ele, por conta de uma possível transferência da sede do Jornal do Brasil para Brasília. “Ele é um arrogantezinho” – diz, acrescentando, mais à frente uma acusação grave: “um rapaz que saiu do emprego em uma editora porque estava tentando vender matérias”. Tanure não soube dar detalhes, mas diz que soube que foi na IstoÉ, talvez confundindo o fato de a própria revista ter sido, tempos atrás, acusada desta prática, numa matéria que falava bem do Rio de Janeiro. Aziz, ao que se sabe, sempre saiu dos empregos por iniciativa própria. Confrontado com a informação, ficou estupefato. “Nunca ouvi tamanho disparate, em toda a minha vida” – revolta-se, indo direto à questão central: “O que o Tanure não quer entender é que não fui quem parou a avenida Rio Branco ou fez as passeatas contra o jornal, mas sim os próprios empregados do JB, preocupados com o rumo que a empresa iria tomar. E eu não inventei nada. Quem falou que a sede do JB ia se mudar para Brasília foi o Paulo Marinho, homem de confiança do Tanure e vice-presidente da empresa, que revelou isso para mim, na presença da Janice Caetano, vice-presidente do Sindicato. Com esse ataque ele está ultrapassando o limite da sanidade mental. E está abrindo um precedente dos mais perigosos no jornalismo brasileiro, que nunca viu nada parecido.” Aziz está há cinco anos e meio na IstoÉ, como chefe de Redação da sucursal Rio de Janeiro. Iniciou a carreira em 1988 e, nesse período, já registrou duas passagens pelo próprio JB, duas pela Folha e outras duas pelo Globo, onde, em 1996, ganhou, em equipe, o Prêmio Esso, pela matéria sobre a Guerrilha do Araguaia.
Mas que não se substime Tanure. Gostemos ou não de seus métodos e comportamento, ele deu e continua a dar mostras da sua capacidade empresarial, e afirma com todas as letras ter conseguido o que parecia impossível: sanear Jornal do Brasil e Gazeta Mercantil. Um novo Murdoch? “Muito me honra a comparação, mas esse é um figurino que não me cabe. O grande nome do jornalismo brasileiro e verdadeiro Murdoch de nossa imprensa, em minha opinião, chama-se Roberto Marinho”.
Sobre o futuro, promete que colocará toda a sua energia para fazer desses dois jornais novamente produtos do mais elevado nível, o que pressupõe continuados e pesados investimentos em gente (talentos), tecnologia e logística.
Neste dia 30 de janeiro (2ª.feira), Tanure decidiu entrar com nova ação contra o repórter especial Lourival Sant’Anna, dessa vez pela matéria cuja manchete é “Obra de Maluf. Foi Tanure que não fez”, publicada na edição de 25 de dezembro de O Estado de S.Paulo, na qual informa que o “empresário comprou firma contratada no governo Maluf para montar locomotivas e não entregou o serviço”. A empresa é a Emaq. Em nova carta ao Ruy Mesquita, diretor de Opinião do Estadão, ele desmente as denúncias e afirma: “Fica mais uma vez demonstrado, com fatos, que Lourival Sant’Anna faz campanha que me difama, calunia e injuria. Decidi portanto mover nova ação judicial contra Lourival Sant´Anna. O autor será, mais uma vez, processado civil e criminalmente, com ênfase em perdas e danos materiais. Destinarei reparações patrimoniais e multas de cunho pecuniário a instituições de caridade.”
A seguir a íntegra da entrevista concedida por Nelson Tanure ao Protagonistas:
Protagonistas – O senhor administra, hoje, na mídia, três importantes operações editoriais: Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil e revista Forbes. Todas elas adquiridas em delicada situação de mercado. Nesse sentido, eu começaria a entrevista com duas questões:
A. O que o levou a entrar nesse mercado?
B. Por que entrar nele, adquirindo empresas/veículos praticamente insolventes?
Nélson Tanure – O que nos levou a entrar nesse mercado foi, basicamente, o gosto pelo desafio. Nós sabíamos que eram empresas em gravíssimas situações financeira e econômica, mas nós estudamos muito essas empresas antes de entrarmos. Muito. Tínhamos plano de resgate da situação econômica da companhia; tínhamos recursos financeiros importantes, que eram necessários para colocar nessas empresas; tínhamos os homens para tocar os projetos. Outra coisa, tínhamos a total percepção de que, para entrar no mercado de mídia, precisaríamos de marcas muito fortes. E marca, para se criar, só se consegue com muito dinheiro. Mas você precisa, no caso de marcas jornalísticas, algo que o dinheiro não consegue comprar, que é o tempo. O Jornal do Brasil é um jornal com 115 anos de história. Isso recursos financeiros não compram. A Gazeta Mercantil é um jornal com 80 anos. Estamos cansados de ver inúmeras aventuras no mundo de mídia com marcas novas que rapidamente morrem. Então, concretamente, a razão que nos levou a investir e a correr mais risco em empresas de situação difícil é que as marcas eram importantes para o sucesso na atividade de mídia.
Protagonistas – Foi, de certo modo, uma decisão na contramão da história, não foi? Temos no Brasil casos de outros veículos muito importantes que foram à bancarrota sem que houvesse interessados em comprá-los, caso de Última Hora, Manchete e outros.
Nélson Tanure – Sem dúvida. De qualquer maneira, cada caso é um caso. Não adianta generalizar. Eu não conheço o que aconteceu com o Correio da Manhã, por exemplo. Mas nas nossas operações, eu percebi e estudei. Eu não sei se fui contra a maré, mas o fato é que nós tínhamos um plano: como resgatar a situação econômica e financeira dessas empresas e como fazer com que elas voltassem a ter saúde financeira.
Protagonistas – Em que momento o senhor decidiu isso?
Nélson Tanure – No ano 2000, quando a situação do Jornal do Brasil já era muito delicada. Quando entramos no JB, já havia uma situação de não pagar os salários há alguns meses, a redação estava em greve, o crédito totalmente fechado. A situação era de grande crise.
Protagonistas – Quanto o senhor investiu nessas operações, envolvendo Jornal do Brasil e Gazeta Mercantil?
Nélson Tanure – Nós temos um número aproximado. Nós investimos algo da ordem de U$ 60 milhões, nesses cinco anos, nos dois jornais.
Protagonistas – Pagamento de dívidas?
Nélson Tanure – Basicamente nós pagamos quase todo o passivo trabalhista. Passivo, aliás, que nós assumimos integralmente. Falta ainda uma pequena parte para acertar.
Protagonistas – E está caminhando para os 100%?
Nélson Tanure – São muitos acordos e cada caso é um caso. Há muitas ações em vários estados do Brasil. Eu acho que em mais um ou dois anos liquidaremos o assunto.
Protagonistas – Quantas ações trabalhistas existem hoje?
Nélson Tanure – Eu tenho a impressão de que no pico das ações trabalhistas no Jornal do Brasil e na Gazeta Mercantil, assumimos umas 4 mil ações. E hoje elas não devem passar de 600 nos dois jornais. Foram sempre negociações difíceis, algumas individuais, outras coletivas, mas avançamos. E posso garantir que valeu a pena, sobretudo por se tratar de marcas são muito fortes.
“Seria insensatez, em minha opinião, lançar um novo produto. A não ser que ele tenha por trás uma marca muito forte.”
Protagonistas – O senhor não entraria nesse mercado para lançar um produto novo, inédito?
Nélson Tanure – De modo algum. Seria insensatez, em minha opinião, lançar um novo produto. A não ser que ele tenha por trás uma marca muito forte. Eu considero que lançar hoje uma marca no mercado editorial, sem lastro, é uma operação de alto risco. Veja o caso das empresas que decidiram mudar suas marcas. Quem fez isso se deu mal. Eu prefiro não dar exemplos, mas há vários casos, conhecidos de todos nós, de empresas que trocaram as marcas, trocaram de nome e os resultados foram desastrosos.
Protagonistas – Em relação aos investimentos?
Nélson Tanure – Nós investimos muito em tecnologia, em treinamento. Investimos também e muito nas sedes das empresas. Se alguém for visitar hoje as sedes do Jornal do Brasil ou da Gazeta Mercantil, verá que é um prazer entrar lá.
Protagonistas – O senhor falou em investimentos totais de 60 milhões de dólares nesses cinco anos nos dois jornais. Tem algum número específico de 2005?
Nélson Tanure – Na Gazeta Mercantil, nós gastamos R$ 40 milhões, auditados, em 2004. Em 2005 ainda não está auditado.
Protagonistas – Isso em despesas operacionais, investimentos?
Nélson Tanure – Pagamento de dívidas e investimentos em tecnologia. Não esqueça que nós compramos a Gazeta numa situação financeira muito complicada.
Protagonistas – Até onde vai a sua ambição na mídia? O senhor quer ter um império de comunicação? Ou está nessa área de passagem, atrás apenas de bons negócios?
Nélson Tanure – Primeiro eu não quero um império de comunicação e nem gosto desse tipo de expressão e acho que ela é falaciosa. Agora eu gostaria de fazer uma empresa de mídia que fosse um exemplo, um benchmark da área, ou seja, uma empresa com uma saúde financeira muito boa, com os melhores títulos, presente em muitas áreas da mídia, entendendo mídia como meio, seja na área eletrônica, seja nas áreas tradicionais. Gostaria de deixar um legado, porque no fundo isso não nos pertence. Essas marcas vão nos transcender. Nós vamos passar e elas vão ficar. Se for possível contribuir para fazer com que essas marcas, que são verdadeiras instituições brasileiras, sejam perenizadas, independente de ser ou não em papel, é uma grande contribuição, é um legado fantástico.
“Gostaria de deixar um legado, porque no fundo isso não nos pertence. Essas marcas vão nos transcender. Nós vamos passar e elas vão ficar.”
Protagonistas – E o senhor acha que vai conseguir isso? De que forma?
Nélson Tanure – No fundo eu vou conseguir isso com a perseverança. Quero levar para dentro dessa empresa, desses jornais, conceitos empresariais. Quero destruir os paradigmas ultrapassados, acabar com os clichês, produzir um jornalismo de qualidade, ter as melhores pessoas, as pessoas mais preparadas, dispor de moderna tecnologia, ter links no mundo inteiro. Enfim, quero levar a modernidade para dentro desses veículos. Trabalhar em cima de conceitos. A verdadeira liberdade de uma empresa de mídia passa por sua saúde financeira. É condição sine qua non.
Protagonistas – De uma forma sucinta quais são os paradigmas que o senhor considera que precisam ser quebrados dessa imprensa tradicional?
Nélson Tanure – Primeiro levar para dentro da empresa o conceito de que aquilo é uma empresa. Ela não é um partido político, não é o quarto poder da república, não deve ser subsidiada. Para que uma empresa sobreviva, ela precisa de resultados positivos. Ou seja, no fim do mês, na conta do padeiro, tem que entrar mais dinheiro do que sair. Aparentemente essa é uma visão simplória, mas não é. Não é especialmente numa empresa que vem carregada de vícios, de pessoas que acham que ali está um dos pilares do País.
Protagonistas – Podemos entender essa sua afirmação como uma crítica aos veículos de comunicação de uma forma geral?
Nélson Tanure – Eu vi muito isso no Jornal do Brasil. Eles se achavam parte da República, que aquilo era um poder institucionalizado.
Protagonistas – O senhor não tem medo de a mídia se voltar contra sua pessoa, de ela o considerar prepotente, fazendo uma afirmação dessas?
Nélson Tanure – Eu não sou prepotente, em primeiro lugar. Em segundo, eu não sei por que a mídia seria contra.
Protagonistas – Os barões da imprensa, digamos assim?
Nélson Tanure – Eu acho, pelo pouco que conheço, que eles hoje pensam também nessa linha. Há a percepção de que aquelas empresas precisam ter lógica econômica. Sem ela, e hoje isso é crença no mundo todo, nesse segmento, não se vai a lugar algum.
Protagonistas – O senhor falou em trazer bons nomes, que possam contribuir nesse processo de transformar a Editora JB numa empresa exemplar. Porém, nesses cinco anos tanto o Jornal do Brasil quanto a Gazeta Mercantil perderam profissionais de valor, de grande reconhecimento. De certo modo isso não é contraditório: contratar agora, quando poderia ter evitado a saída, antes?
Nélson Tanure – Eu diria o seguinte: algumas pessoas boas foram embora, não muitas. Em compensação, contratamos muitas pessoas boas. Só para dar um exemplo, no Caderno B do JB, que é um caderno tradicional do Rio de Janeiro, contratamos mais de 30 jornalistas, escritores ou articulistas da melhor qualidade. A Gazeta Mercantil está repleta de novos articulistas. O JB, como um todo, nem se fala. Eu acho que provavelmente, dos grandes jornais brasileiros, o naipe de articulistas do JB é um dos melhores.
“Você sabia que a Gazeta Mercantil chegou a ter uma redação maior do que a do New York Times?”
Protagonistas – O senhor pode citar alguns nomes?
Nélson Tanure – Villas Boas Correa, Augusto Nunes, Mauro Santayana, Frei Leonardo Boff, Ziraldo, Fausto Wolf, Wilson Figueiredo, Amauri Mello. E de todos os matizes, da extrema direita, como Olavo Carvalho, à extrema esquerda como o Milton Temer. Saíram, sim, alguns grandes valores, mas eu diria que a maioria dos que saíram fazia parte de um corporativismo que não tem espaço no momento atual do Brasil. Você sabia que a Gazeta Mercantil chegou a ter uma redação maior do que a do New York Times?
Protagonistas – Quantos jornalistas havia quando os senhores chegaram às empresas e quantos têm atualmente?
Nélson Tanure – Muita gente já tinha saído, muita gente estava lá, mas já não recebia salário fazia muito tempo. Temos uma redação de 350 jornalistas nos dois jornais. Que é um belíssimo número. Hoje, temos um sistema chamado Unidade de Conteúdo e todos trabalham para essa unidade e não existe mais muita diferença entre quem é do Jornal do Brasil ou da Gazeta Mercantil. Claro que, como são segmentos distintos, alguma diferença acaba existindo, mas nós estamos trabalhando muito para acabar com essa separação.
Protagonistas – Há algum horizonte, um prazo como meta? A chegada do Augusto Nunes é um pouco para isso?
Nélson Tanure – O Augusto é um homem de excepcional talento. Aliás, se há coisa que nós queremos é ter cada vez mais em nossa empresa pessoas de talento. Qualquer pessoa de talento será muito bem-vinda em nossa empresa. O Augusto vai conseguir também contribuir para esse processo. Ele está num grande momento da vida.
Protagonistas – A Editora JB é candidata a comprar outros veículos?
Nélson Tanure – Ela é muito candidata a consolidar de uma maneira definitiva o Jornal do Brasil e a Gazeta Mercantil, como dois quality papers da melhor estirpe. Este ano vamos focar muito, muito, na melhoria dos dois jornais. Queremos que eles sejam belíssimos jornais. No seu conteúdo, no prazer da leitura, na sua credibilidade, nos seus articulistas, nos seus comentaristas, nos seus jornalistas. Esse é o nosso plano número um para esse ano.
Protagonistas – Qual a situação financeira das empresas, hoje? Já há sinalização de lucro?
Nélson Tanure – No ano passado nós tivemos uma margem de contribuição bruta (lucro bruto) de R$ 40 milhões. Esse ano nós pretendemos fazer uma margem de contribuição bruta de R$ 60 milhões. Nós temos hoje atividades com excelente margem operacional. O que ainda nos prejudica são as surpresas do velho JB e da velha Gazeta que consomem volumosos recursos, sobretudo para a quitação dos passivos trabalhistas.
Protagonistas – Os maiores passivos são trabalhistas?
Nélson Tanure – Só são trabalhistas. O resto já não tem mais nenhum passivo. O resto é zero, banco, papel etc. Pagamos tudo.
Protagonistas – O senhor tem idéia do montante trabalhista ainda em execução?
Nélson Tanure – Não, porque infelizmente as demandas trabalhistas são sempre permeadas de todos os tipos de direitos e depois de pseudosdireitos. Agora mesmo estamos fazendo um acordo com pessoas que continuam trabalhando na empresa e eram da velha Gazeta. Um acordo já para finalizar. Nós queremos que todos os que estão trabalhando na companhia estejam com os direitos antigos resolvidos. São aproximadamente 190 pessoas. Estamos em negociação.
Protagonistas – E daqueles que saíram, incluindo os que integram a Associação de Credores da Gazeta Mercantil?
Nélson Tanure – Boa parte daqueles membros da Associação já recebeu e boa parte está dentro desse grupo de 190. Porque tem pessoas que estavam na Associação, mas também entraram com ações individuais. São várias situações atípicas. Nós estamos resolvendo muitas delas.
Protagonistas – O senhor acredita que em 2006 conclua as negociações?
Nélson Tanure – Eu diria o seguinte: em 2007 só restarão grandes casos. Jornalistas que ganhavam 30 mil dólares por mês, esse tipo de caso que está sendo discutido com maior profundidade.
“Nunca tomei na minha vida uma ação contra ninguém. Agora se alguém fizer algo comigo, as reações que tenho às vezes são desproporcionais. Isso é uma característica minha, um erro talvez, um defeito meu. Mas sou assim.”
Protagonistas – A sua não foi, digamos assim, uma entrada tranqüila, no meio jornalístico. Pegou empresas com muitos problemas e equipes numa situação até certo ponto desesperadora. E foi duro e frio nas negociações, pelo que pudemos acompanhar, passando a imagem de ser muito mais preocupado com os números do que com a situação das pessoas. Onde o senhor considera que acertou e errou nessas negociações?
Nélson Tanure – O que posso falar de mim é que no plano pessoal sou uma pessoa muito simples e que cultiva a simplicidade. Odeio a arrogância, a prepotência, o orgulho e essas são características muito bem conhecidas de todos que trabalham comigo. Cultivo a simplicidade até por ser uma pessoa muito cristã. E acho isso uma coisa importante na vida. Agora, sempre fui muito determinado. Um cara que saiu do Nordeste para vencer no Sul, enfrentando todos os tipos de preconceitos. Nós somos uma sociedade lusitana e preconceituosa. Eu falo de um modo geral, o que é um fato. Nisso tudo foi se criando essa fama. Aí você pergunta se eu sou um cara frio. Eu não sou um cara frio, eu sou um cara que trabalha muito com o sentimento, com a intuição. Aliás, eu nem gosto de pessoas frias. Com pessoas que não têm sangue na veia eu nem me relaciono bem. Dizer que eu sou frio é também uma inverdade. Vejo também a citação de que eu sou calculista. Eu, na verdade, penso muito. Penso e aconselho a todas as pessoas perto de mim ou que trabalham comigo a pensar. Se isso é ser calculista, sou calculista. Porque procuro refletir e estudar as coisas. Tento sair do superficial, ser profundo e não gosto da superficialidade. O que mais posso dizer de mim? Se for para fazer uma autocrítica, e eu tenho pensado sobre isso, digo que sou uma pessoa que reage de uma maneira desmesurada. Não provoco ninguém. Nunca tomei na minha vida uma ação contra ninguém. Agora se alguém fizer algo comigo, as reações que tenho às vezes são desproporcionais. Isso é uma característica minha, um erro talvez, um defeito meu. Mas sou assim. E mais, a reação embora desmesurada, nunca é fruto de um rompante. Ela é pensada, muito bem pensada. Em toda a minha trajetória de vida, sempre reagi. Nunca agi para atacar alguém. Eu gosto da composição, da negociação, do entendimento. Não gosto do conflito e o considero fundamentalmente um erro. Confrontar é uma coisa ultrapassada, sem sentido. Hoje estamos no mundo da cooperação. Eu tenho essa percepção. Agora, esse meu jeito de ser faz com que eu tenha reações desmesuradas. Eu me conheço muito bem.
Protagonistas – Mas onde, o senhor, que foi muito criticado nesse processo, considera que acertou ou errou?
Nélson Tanure – Acho que acertamos na maioria delas (pausa). O que aconteceu foi que nós talvez tenhamos subestimado a capacidade de ingratidão das pessoas. Esperávamos que isso acontecesse, porque é humano, mas não como ocorreu. Moisés libertou os hebreus com uma ordem de Deus, e logo depois os hebreus estavam adorando um bezerro de ouro. Você compreende? Não iria, portanto, me iludir achando que as críticas não surgiriam. Hoje, vejo as pessoas criticarem e entendo, obviamente, que a insatisfação é da natureza humana. E também não tenho a pretensão de ser julgado no curto prazo. De todo modo, considero que essas críticas que estão sendo feitas são críticas superficiais. E falo isso porque sou uma pessoa que já passou por muitas provações, e não esperaria outra coisa que não fosse a crítica.
Protagonistas – Tem alguma coisa nesse processo da qual o senhor tenha se arrependido, algo que considera que poderia ter feito diferente?
Nélson Tanure – Provavelmente se nós tivéssemos feito um permanente processo de relações públicas ou um permanente processo de explicar à exaustão o que estávamos fazendo, o resultado de percepção seria melhor, mas não o resultado pragmático. E depois tem o seguinte: tivemos de enfrentar e vencer verdadeiras guerras, para recuperar essas empresas.
Protagonistas – O senhor acha que vez tudo o que estava ao seu alcance, ou poderia ter sido um pouco melhor?
Nélson Tanure – Poderia ter sido melhor, mas é assim mesmo. Poderia ter feito melhor, e também poderia ter feito melhor e poderia ter feito melhor. Sempre é um processo onde cabe mais. Mas o fato é que quem dirige esses processos é a circunstância.
Protagonistas – Concretamente – é essa é uma constatação – há um consenso entre os jornalistas de que o senhor e seus representantes fazem de tudo para ganhar tempo nessas negociações. A grande crítica que se faz – e eu ouvi pessoas da Associação antes de vir para a entrevista – é a de usar armas jurídicas de que dispõe à exaustão para protelar e estender as negociações. Os jornalistas, de um modo geral, dizem que o senhor faz isso apostando na desmobilização e na extinção natural de muitas dessas ações. Já vimos, aliás, esse filme antes várias vezes, inclusive quando o Sílvio Santos comprou a Tupi, anos atrás. O senhor não considera que, ao assumir o Jornal do Brasil e a Gazeta Mercantil, deveria arcar com esses custos e resolver isso rapidamente? A empresa hoje não tem condições, pelo seu faturamento, de fazer esse ajuste rapidamente?
Nélson Tanure – Quem falou isso não sabe o que está falando. Extinção de ação não existe. Hoje em dia a Justiça do Trabalho é uma justiça ágil, é a única justiça que tem o poder de bloquear a sua conta bancária, e todos sabem disso. Nós sofremos inúmeros bloqueios, fizemos acordos, mas vir com essa história de que estamos querendo ganhar tempo? Desculpe-me, mas essas críticas são ridículas, superficiais. Nós tivemos muito cuidado com casos especiais, pessoas que necessitavam de tratamento de saúde ou tinham problemas familiares. O último lugar para se querer ganhar tempo é a Justiça do Trabalho. O juiz de primeira instância bloqueia a sua conta bancária e não só da companhia, mas também do sócio, do conselheiro, do gerente.
Protagonistas – O senhor falou do apoio que a empresa tem dado a alguns funcionários em razão de situações especiais, particularmente com problemas de saúdes e familiares. No entanto, Protagonistas obteve a informação de que há o caso de uma funcionária, que estava com câncer, cujos direitos trabalhistas eram da ordem de R$ 200 mil, sendo que a empresa teria oferecido a ela menos da metade disso e ainda parcelado em dez vezes, para fazer um acordo. E ela necessitava desse dinheiro exatamente para cuidar dos problemas de saúde.
Nélson Tanure – Eu não conheço o caso. Conheço um caso de uma senhora que necessitava de medicamentos e precisava viajar e nós fomos absolutamente parceiros. Mas eu não conheço esse caso. Se você quiser me passar o nome da pessoa, eu agradeço. Mas duvido que haja casos desse tipo, pois não é da nossa cultura tirar proveito. Quanto mais de uma pessoa nessa situação. Se quiser ver, vai lá dentro da Gazeta e pergunta para as pessoas. Agora essa crítica que essa pessoa fez aí é uma idiotice.
“Essas são características com as quais eu lido muito mal, com a traição, com o jornalista que liga pra você e pergunta, e depois faz uma matéria completamente distinta e diz que te ouviu.”
Protagonistas – Sendo hoje um empresário também da mídia, por que o senhor não gosta de dar entrevistas? Não gosta de jornalistas?
Nélson Tanure – (Risos) Eu gosto de dar entrevistas e tenho alguns amigos jornalistas. O que eu não gosto é do mau profissional, da pessoa superficial, que escreve sem saber o que está escrevendo. Ou de pessoas que ouvem uma coisa e escrevem outra, porque são mal intencionadas. Essas são características com as quais eu lido muito mal, com a traição, com o jornalista que liga pra você e pergunta, e depois faz uma matéria completamente distinta e diz que te ouviu. Isso me faz muito mal e é um desserviço à sociedade.
Protagonistas – Como o senhor trata isso em relação as suas equipes?
Nélson Tanure – Temos feito grandes progressos. Nós somos um jornal líder, que denunciou o Mensalão. Apanhamos porque denunciamos o Mensalão, nós bancamos essa história e depois a Folha deu com grande destaque. Eu tenho pregado muito pela ética jornalística. Eu gosto de jornalistas, que são pessoas interessantíssimas, mas o que eu não gosto é do mau jornalismo.
Protagonistas – Eu gostaria de falar sobre o episódio que tem colocado o senhor contra o Estadão, por conta de matérias escritas pelos jornalistas Lourival Sant’Anna e Alberto Komatsu. O senhor, por tudo que pudemos acompanhar, considerou ofensivo e difamatório à sua honra o que foi veiculado. Acompanhando os dois jornais pelo senhor dirigidos, percebemos claramente a decisão de dar um troco a essas pessoas, sobretudo ao Lourival. Ambos têm publicado sistematicamente, nos últimos dias, matérias, aparentemente sem nenhum gancho visível, para atacar esses personagens. São as matérias sobre o caso Pimenta Neves, sobre o livro lançado meses atrás pelo Lourival Sant’Anna sobre a Guerra no Iraque etc. A percepção clara no mercado jornalístico é de que se trata de uma vingança. O senhor considerou a atitude do Estadão e dos repórteres do jornal antiética e está aparentemente agindo do mesmo modo. O senhor e os jornais que dirige não estão sendo antiéticos?
Nélson Tanure – O que é antiético, em primeiro lugar, é um jornalista usar a força e a tradição de um jornal como o Estado de S. Paulo, para publicar contra uma pessoa qualquer, no caso eu, uma série inominável, inominável, inominável de mentiras sobre as pessoas. Aquilo é uma fraude. Mais do que antiético, aquilo foi uma fraude. Isso é que faz um mal ao jornalismo impresso. E aí quando você vai lá e mostra que aquilo tudo era fruto de um dossiê fabricado, surgem as críticas. E não foi só aquela matéria não. Teve uma outra feita pelo mesmo repórter sobre mim e sobre a Fepasa, que eu nunca tinha ouvido falar. Uma série de mentiras. Então o que é antiético, o que é mau jornalismo? Isso é mau jornalismo! O que aconteceu foi que nós, como era de se esperar, demos entrada em São Paulo com uma queixa de crime contra a honra, um processo normal, e demos aqui no Rio de Janeiro entrada com uma queixa-crime sobre a confecção desse dossiê. E nós demos publicidade a esses dois temas. Quando, para surpresa nossa, veio à tona informações de que esse elemento que escreveu, o Sandoval (NR: na verdade Lourival), era braço direito do Pimenta, que o Pimenta estava solto, que o Pimenta andava armado, que o Pimenta falava com ele de dentro da redação. Depois apareceu contra esse cidadão um tal nível de sujeira, que nos vimos na obrigação de publicar – que ele é um homem do PT, que passa informações para o PT, que faz livro sem ir no lugar, esse tipo de coisa. O que me espanta é uma instituição como O Estado de S. Paulo abrigar pessoas como esses cidadãos, o Pimenta, o Lourival, o Komatsu, que também é um rapaz leviano. E o que aconteceu é o que eu chamo de reação. O que foi antiético, o que foi uma fraude, foi o que eles fizeram, esse Lourival e esse Komatsu.
Protagonistas – O senhor não considera a sua reação antiética?
Nélson Tanure – Não, absolutamente. Porque inclusive tem o seguinte: a nossa reação ela é toda ela factual.
Protagonistas – O Lourival desmente, em entrevista dada ao Observatório da Imprensa, quase todas as informações publicadas.
Nélson Tanure – Desculpe, ele não desmente. Ele simula desmentido. Mas ele não nega.
Protagonistas – Por exemplo, ele afirma que estava nos Estados Unidos, quando a Sandra Gomide foi assassinada.
Nélson Tanure – E daí, porque ele está nos Estados Unidos, o telefone não opera? Ele simulou desmentidos, insisto.
(Nesse momento, Tanure pediu para desligar o gravador e fez outros comentários sobre o tema).
“Eu nunca fui à redação do JB, nem da Gazeta. Nunca fui. Conheço muito poucas pessoas. Minha relação é de total autonomia e independência mesmo. Eles têm total liberdade.”
Protagonistas – Como é sua relação com o mundo editorial? Mantém contato com os jornalistas da Editora JB, tem encontros com outros dirigentes de imprensa?
Nélson Tanure – Pouquíssimo. Eu nunca fui à redação do JB, nem da Gazeta. Nunca fui. Conheço muito poucas pessoas. Minha relação é de total autonomia e independência mesmo. Eles têm total liberdade. De novo, o que me deixa muito triste é quando eu vejo o mau jornalismo. Quando vejo erros, quando vejo que a matéria não reflete o que está acontecendo. Isso me deixa muito triste.
Protagonistas – O senhor não acha importante a sua presença de vez em quando dentro da redação?
Nélson Tanure – Não, eu acho o contrário. Acho importante incentivar a liberdade com responsabilidade. Eles precisam ter responsabilidade pelo que escrevem. Não é a minha presença que vai ajudar ou não. E acho que a gente tem tido sucesso nisso. Eu nunca soube qual a manchete do jornal de amanhã. Nem o editorial.
Protagonistas – Num caso como esse, por exemplo, envolvendo o Estadão, o senhor tomou conhecimento?
Nélson Tanure – Eu tomei conhecimento que iríamos entrar com as ações, pois o departamento jurídico percebeu que aquilo era um crime contra a honra e que deveríamos levar para a polícia a questão dos dossiês. Isso foi noticiado e de repente veio uma enxurrada de informações sobre o comportamento desses elementos, enxurrada de informações sobre o Pimenta, sobre o Lourival, sobre o Komatsu.
Protagonistas – Nessa matéria do Lourival Sant’Anna e em outras, como a da Exame, e da revista Lide do Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio, o senhor é descrito como um empresário oportunista, que está atrás do lucro fácil, com bons relacionamentos com a Justiça e com o poder. Entre os jornalistas, particularmente, pelo que acompanha o Protagonistas, chega a se falar na fama de predador, que, aliás, o levou a mover processos contra algumas pessoas, entre eles o próprio Lourival e os presidentes dos sindicatos dos jornalistas do Município do Rio e de São Paulo. Isso é inédito na história. Nunca, antes, nenhum dirigente de mídia havia processado dirigentes sindicais. O senhor não tem medo de entrar para a história como o homem que quer combater os representantes de seus empregados?
Nélson Tanure – Olha, eu não sou um predador. Eu sou uma pessoa delicada, educada, uma pessoa fina, de pouco relacionamento. Essas são algumas características minhas. Sou um cara muito voltado para a família, com quatro filhos, casado há quase 30 anos. Estou fazendo esse preâmbulo para dizer que não tenho essa coisa do predador. O que, aliás, não é nada demais, porque a natureza está cheia de predadores. Mas de qualquer maneira esse não é o meu perfil. Nessa questão dos sindicatos, uma coisa que me deixou muito impressionado é como uma classe de pessoas letradas, de pessoas que estudaram – e o jornalismo é uma carreira universitária -, de pessoas que dão opinião sobre os destinos do País, da política, da economia, pessoas substantivas, que são a maioria dos jornalistas, como esses homens deixam a sua representatividade constitucional, que é o sindicato, nas mãos de elementos como o atual presidente do Sindicato do Rio, que é um rapaz que saiu do emprego em uma editora porque estava tentando vender matérias. Isso é esse Maluf Aziz Filho (NR: na verdade, Aziz Maluf Filho). Esse cara inventou, para fazer uma passeata, que nós iríamos mudar o Jornal do Brasil para Brasília. E foi para a praia distribuir panfletos.
Protagonistas – Mas no mercado efetivamente corria a informação de que o senhor estava mudando a redação do JB para Brasília…
Nélson Tanure – Mas a minha pergunta é a seguinte: isso cabe na cabeça de alguém? Então como é que nasce uma informação dessas? É uma pessoa de ma fé.
Protagonistas – Mas não pode ter nascido dentro da própria redação do JB?
Nélson Tanure – Eu não sei onde nasceu, mas digamos que tenha nascido dentro da redação. O que cabe a um dirigente sindical responsável? Procurar as pessoas, questionar e fazer o papel dele. Outra coisa é fazer daquilo uma bandeira. É sair na praia distribuindo panfletos. Porque ele tinha acabado de chegar, ele queria espaço, ele queria notoriedade. E aí a minha pergunta é a seguinte: fazer o que com um elemento desses?
“Uma outra coisa que me impressionou muito na Gazeta Mercantil foi ver jornalistas que opinavam e opinam diariamente sobre os mais diferentes temas, sejam eles negócios, finanças, macro-economia etc, deixarem acontecer o que aconteceu naquele jornal.”
Protagonistas – O senhor não preferiria o diálogo?
Nélson Tanure – Eu preferiria o diálogo, pois como te disse antes eu sou um homem do diálogo. Mas o que aconteceu foram fatos. Antes de qualquer diálogo, ele já tinha parado a Avenida Rio Branco, enchido o prédio do JB de cartazes, e feito duas passeatas na praia nos domingos, em Ipanema, na avenida, dizendo que iríamos levar o Jornal do Brasil para Brasília, como se nós fôssemos uns débeis mentais em último grau. É que nem dizer que a Folha de S.Paulo, um jornal de São Paulo, vai mudar para Goiânia.
MTroyjo – E falaram que isso se daria por causa de um acordo seu com o Roriz – (NR: governador Joaquim Roriz, do Distrito Federal) (risos).
Nélson Tanure – E que é uma pessoa que nunca vi em minha vida. Que devaneio. O pior é que um elemento pernicioso no meio de um grande grupo de pessoas de bem, acaba contaminando essas pessoas. Por isso eu acho que os jornalistas de bem, que são a quase totalidade, deveriam tomar conta dessas instituições, instituições que se queira ou não, se goste ou não, são representações legítimas da base, seja no campo dos empregados, seja dos patrões. Agora deixar a instituição nas mãos de um rapaz desses é uma tremenda irresponsabilidade. Eu queria acrescentar também o seguinte: uma outra coisa que me impressionou muito na Gazeta Mercantil foi ver jornalistas que opinavam e opinam diariamente sobre os mais diferentes temas, sejam eles negócios, finanças, macroeconomia etc, deixarem acontecer o que aconteceu naquele jornal. Para você ter uma idéia, no ano anterior à nossa entrada na Gazeta, dos doze meses do ano eles tinham recebido apenas seis meses. Eles recebiam por vale, e no final de doze meses receberam o equivalente a seis. Esses homens, com todo esse conhecimento de economia, deixavam isso acontecer dentro da companhia deles. Isso é uma coisa que me soou estranho, porque, de novo, no mundo pragmático etc, você tem de olhar lá fora, mas não pode se descuidar das questões pessoais, e isso foi deixado de lado. Vejo jornalistas tratando de temas importantes do mundo exterior, mas que esquecem de olhar o patrão que não recolhe o Fundo de Garantia.
Protagonistas – O senhor tem também um processo contra o presidente do Sindicato de São Paulo, o Fred Ghedini.
Nélson Tanure – Ele disse nessa revista (NR: revista Lide, editada pelo Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro) que eu era um predador. Esse Fred Ghedini sabe do excepcional trabalho que nós fizemos de recuperação da Gazeta Mercantil. Esse sabe. Porque ele acompanhou, ele sabia da situação da empresa, e sabe o que nós fizemos. E de novo, como é uma pessoa retrógrada, ele queria que continuasse com carteira assinada, essas coisas antigas, e por causa disso começou a dizer que eu era predador. Mas esse, se quiser conversar sério, se quiser conversar olho no olho… Pergunte a ele o que fizemos, como a gente pegou a Gazeta e como é hoje.
MTroyjo – A frase que ele usou é “você destrói tudo aquilo onde põe a mão”.
Nélson Tanure – Agora um homem que viu a Gazeta como ele viu, falar as coisas que falou…
Protagonistas – Mas como dirigente sindical, em nenhum momento ele poderia aplaudir essa decisão da Editora JB de incentivar a figura do PJ.
Nélson Tanure – Mas ele também poderia ter reconhecido o que a gente fez…
Protagonistas – O senhor considera isso retrógrado, mas a lei é essa. Existe, como sabemos, caminhos, trilhados pelas empresas para driblar a legislação, em função das dificuldades enfrentadas com os altos custos dos encargos sociais, mas isso é ilegal. Qualquer PJ que entre com um processo contra a empresa terá, em tese, boas chances de êxito.
Nélson Tanure – Em tese, não. Certamente ele ganhará.
“Em minha opinião, mais tempo ou menos tempo isso (CLT) vai acabar. Porque no Brasil um funcionário ganha pouco e custa muito. Porque na relação trabalhista …existe uma “mão invisível” que arrecada o mesmo que o funcionário ganha e não dá nada em troca.”
Protagonistas – Nesse sentido, como o senhor vê essa questão da Justiça, da CLT?
Nélson Tanure – Em minha opinião, mais tempo ou menos tempo isso vai acabar. Porque no Brasil um funcionário ganha pouco e custa muito. Porque na relação trabalhista entre um empregador e um empregado existe no meio uma “mão invisível” que arrecada o mesmo que o funcionário ganha. E essa mão arranca esse dinheiro e não dá nada em troca. Nenhum funcionário nosso tem benefícios do INSS ou coisa parecida. Então isso é uma relação que está se extinguindo, quase todas as empresas, exceto para níveis salariais muito baixos, não usam mais a velha CLT. E nós, também no Jornal do Brasil e na Gazeta Mercantil, para salários até R$ 3 mil, adotamos o regime CLT. Aí digo o seguinte: você contrata, por exemplo, uma pessoa por R$ 6 mil, pela CLT. É muito melhor para ela e para a companhia pagar R$ 9 mil e fazer um contrato como Pessoa Jurídica, até porque as pessoas têm uma série de outras vantagens, do que ficar com R$ 6 mil em carteira. É melhor para o funcionário que ganha mais e para a empresa que gasta menos. E tem um dado que eu queria passar: até junho a editora vai ter o nível médio salarial mais alto da praça do Rio de Janeiro. Então o que aconteceu conosco é que os níveis de remuneração subiram muito.
Protagonistas – É baseada em que essa informação?
Nélson Tanure – Média de remuneração pesquisada.
Protagonistas – Mas tem isso publicado em algum lugar?
MTroyjo – O Amauri Mello, que está conosco, fez essa pesquisa, e também o Paulo Fraga, que era de O Dia, trouxe informações atualizadas sobre os salários de lá. E pela evolução dos nossos números em maio nós deveremos chegar a um salário médio, na Editora, de R$ 5,3 mil.
Nélson Tanure – R$ 5,3 mil de salário médio! E mais uma série de vantagens. E tem outra coisa, vai perguntar para as pessoas o que elas querem.
Protagonistas – Essa, aliás, é uma grande contradição, porque o sindicato está aí para defender os direitos dos trabalhadores, mas as pessoas não necessariamente querem isso, preferindo ter o dinheiro no bolso…
Nélson Tanure – O tempo vai regular essas relações. Temos aqui no Brasil um capitalismo ainda nascente.
Protagonistas – Mesmo não sendo essa a nossa função, Protagonistas arrisca aqui um papel moderador: não seria melhor resolver isso, essas pendências com os presidentes do Sindicato, com o Lourival, fora da Justiça?
MTroyjo – O Lourival fez a matéria, o Tanure escreveu uma carta respondendo todos os pontos, nós fomos lá, conversamos com eles, convidamos eles para virem aqui.
Nélson Tanure – Essa carta que me tomou dois dias é uma carta educada, e que foi muito mal recebida por lá. E o que tivemos em troca? Arrogância. Ele dizendo que é isso mesmo, que domingo ia ter mais. Nesse nível. Uma arrogância impressionante. Do mesmo modo que esse rapaz do Sindicato do Rio, que é um outro arrogantezinho. Desculpe-me, mas são pessoas que não cultivam a humildade, coisa que eu sempre aprendi a cultivar na minha vida. Só porque assumiram um cargo de presidente do Sindicato, deixam subir todo aquele processo freudiano à cabeça. Ou porque o cara é um jornalista de O Estado de S. Paulo se julga no direito de manchar a reputação de qualquer pessoa com mentiras.
Protagonistas – Retomando a questão das aquisições de Jornal do Brasil e Gazeta Mercantil, uma das principais críticas que se faz ao senhor e às famílias Nascimento e Brito e Levy é a de criarem uma empresa nova para ficar com a parte saudável do negócio, deixando todo o passivo para a chamada banda podre, ou seja, para a empresa original, que já estava com uma situação muito complicada. Foi isso mesmo? Como se deram essas negociações?
Nélson Tanure – De novo são críticas superficiais, críticas de quem não conhece o que foi feito. E volto a insistir na nossa característica lusitana: “não ouvi, não gostei e já saio criticando”. Foi feita uma operação totalmente dentro da lei, da modernidade. Foi separado coisa nenhuma! Nós pagamos todo o passivo (e o que não pagamos somos responsável), exceto a parte fiscal que é intransferível e além do mais estava sob regime do Refis. E nós não compramos, nós arrendamos as duas marcas. São críticas superficiais, críticas adjetivas, críticas de quem está a fim de falar mal. Essas pessoas gostariam mesmo de ver essas instituições acabadas. Aí sim, você pode ter certeza de que o espírito de solidariedade deles vem à tona. São pessoas solidárias no fracasso.
“Essas pessoas gostariam mesmo de ver essas instituições acabadas. Aí sim, você pode ter certeza de que o espírito de solidariedade deles vem à tona. São pessoas solidárias no fracasso.”
Protagonistas – O senhor pode divulgar quanto foi pago para as famílias nessas negociações?
Nélson Tanure – Isso eu não vou falar. Mas você pode verificar a situação deles antes e depois.
Protagonistas – Continua pagando uma parte do arrendamento? Eles têm participação no faturamento?
Nélson Tanure – Total e estão felizes da vida. O que o Lourival falou foi uma sandice, e o Levy declarou – e está nos dando uma carta sobre isso – que nunca falou aquilo. Tenho aqui os documentos da Trevisan de que nós gastamos R$ 40 milhões só no ano de 2004. E vem agora esse Sandoval (NR: na verdade Lourival) dizer que nós não gastamos um tostão!
Protagonistas – Em 2005 é mais ou menos?
Nélson Tanure – É igual. Desculpe-me, mas passa pela cabeça de alguém desse mercado que o Luiz Fernando Levy ia fazer uma operação dessas e não ia ver a cor do dinheiro?
Protagonistas – Recapitulando o processo de compra da Gazeta Mercantil, ele acabou se dando em duas etapas. O senhor fez uma negociação inicial, ela acabou desfeita, entrou no processo o German Efromovith e depois o retomou? Pode contar um pouco de como elas foram feitas?
Nélson Tanure – (Nesse momento Tanure voltou a pedir para desligar o gravador. Revelou alguns detalhes da primeira negociação, de como foi o distrato, das negociações flexíveis para receber de volta, de Levy, o dinheiro que havia adiantado, da passagem de German Efromovith por lá e por fim o novo contato que Levy fez com ele, buscando a retomada da negociação, aí sim, resultando num contrato firme).
Protagonistas – Entre os jornalistas e também entre os donos de jornais, já há quem o aponte como uma espécie de Murdoch brasileiro. E aí tem um duplo sentido: o de um empresário que não estaria preocupado com a informação e muito menos com o jornalismo, mas tão somente com o negócio; e, numa visão positiva, o de um empreendedor, que levou para a mídia conceitos empresariais modernos, inovadores etc. Mas no seu caso, a visão é a do Murdoch oportunista, que está no mercado para ganhar dinheiro, aproveitar as oportunidades etc. Qual desses figurinos de Murdoch cabe melhor no senhor?
Nélson Tanure – Existe um só Murdoch. Você acha que um homem que chega ao sucesso de um Murdoch não se preocupa com o produto? Essa é uma visão superficial, maniqueísta. É uma visão lusitana, ou se preocupa com o produto, ou em ganhar dinheiro, como se fossem coisas incompatíveis. Ao contrário. Elas são absolutamente complementares e ele só tem sucesso porque se preocupa com o produto. Não são coisas antagônicas. Para mim é um elogio, mas se teve alguém no Brasil fantástico como Murdoch não sou eu, e sim Roberto Marinho, esse sim foi o grande homem da imprensa brasileira em todos os sentidos. Esse é o verdadeiro Murdoch, no bom sentido. É lamentável esse tipo de pensamento que fica nesse sistema binário: ou é preto ou é branco, ou é heterodoxo ou é ortodoxo, ou é conservador ou é moderno. Isso é uma besteirada.
Protagonistas – Quais os princípios que o senhor defende e propugna em relação à imprensa, considerando que hoje dirige dois importantes veículos da mídia brasileira?
Nélson Tanure – Eu abraço todos esses princípios da liberdade de imprensa, da independência etc. Agora uma das coisas que eu gostaria de agregar é o princípio da profundidade. Para falar de economia, você tem de entender de economia.
Protagonistas – O senhor acha que a imprensa hoje está longe disso?
Nélson Tanure – Eu não acho que está longe, mas eu tenho visto hoje pessoas escrevendo sobre assuntos que não entendem, e isso não deveria acontecer. De outro lado, gostaria de ver a imprensa banida desses poucos maus profissionais. E outra coisa que eu gostaria de trazer para a imprensa brasileira é um novo paradigma, muito pouco explorado, ou explorado de uma maneira meio envergonhada, que é o de constituir um negócio sólido, pois quanto mais sólido e saudável econômica e financeiramente o veiculo, mais ele será independente e de qualidade. Estou convencido disso.
Protagonistas – Hoje qual é a sua relação com a ANJ? A Editora JB é filiada à ANJ? O senhor tem alguma queixa contra seus pares?
Nélson Tanure – Nós não somos afiliados.
Protagonistas – Tem intenção de?
Nélson Tanure – Olha, o Jornal do Brasil foi afiliado a vida inteira da ANJ e a Gazeta Mercantil também. Pelo pouco que eu sei desse assunto, logo que fizemos o negócio, um executivo da ANJ ameaçou nos desfiliar caso não pagássemos rapidamente as dívidas existentes com a instituição. Aí o nosso vice-presidente decidiu pagar e sair, por entender que tanto o JB quanto a Gazeta haviam sido maltratados pela instituição.
Protagonistas – Pensa em reatar ou não?
Nélson Tanure – Essa não é uma decisão minha. Está mais na área de conselho editorial, mas eu tenho muito respeito pela ANJ. Acho que é uma associação de peso. Mas sinceramente não tenho os detalhes e não sei direito o que aconteceu, pois a coisa se deu na esfera de nosso vice-presidente Hélio Tuchler.
Protagonistas – Como o senhor administra seu tempo, com tantos negócios e em áreas tão distintas?
Nélson Tanure – Eu e confio muito nas pessoas.
“Não sou um condutor e sim um gestor. Numa comparação com a música clássica, da qual gosto muito, eu diria que costumo escrever a partitura, compor a música, mas não sou o maestro.”
Protagonistas – Como divide o seu tempo?
Nélson Tanure – Eu fico a maior parte do meu tempo sozinho, pensando, analisando, e toda a contribuição que considero substantiva passo à equipe. Não gosto de estar no dia-a-dia de uma companhia. Não sou um condutor e sim um gestor. Numa comparação com a música clássica, da qual gosto muito, eu diria que costumo escrever a partitura, compor a música, mas não sou o maestro. Uma coisa é escrever a partitura, outra bem diferente é comandar a orquestra.
Protagonistas – A sua família mora nos Estados Unidos?
Nélson Tanure – Não, morou. Isso faz dez anos. Eu tenho um filho que estuda lá e minhas filhas também estudaram lá. Mas é só isso.
Protagonistas – Quais são seus planos na mídia e fora da mídia?
Nélson Tanure – Esse ano nós vamos investir e focar em qualidade editorial, em circulação. Esse é o nosso grande projeto. Eu acho que hoje nós temos uma empresa com alicerces firmes e vamos, agora, construir em cima desses alicerces.
Protagonistas – Já tem idéia do faturamento de 2005?
Nélson Tanure – O conceito de faturamento dessa empresa é diferente do conceito das outras. O faturamento aqui dessa empresa é o que entra no caixa.
Protagonistas – Já pode nos dizer algo sobre o novo Jornal do Brasil?
MTroyjo – Estamos às vésperas de mostrar para nossos leitores a “planta do apartamento”, ou seja, quais as mudanças que vão ocorrer no jornal e que serão apresentadas a eles na primeira semana de março. Será um jornal muito amigo do internauta, que retomará sua vocação de um jornal do Rio de Janeiro, reforçado por alguns importantes nomes da imprensa brasileira e embalado por um novo projeto gráfico e editorial.
Protagonistas – Algum nome que já possa revelar? Já estão todos fechados?
MTroyjo – Sim, estão todos fechados, mas eu não posso revelar porque eles ainda estão trabalhando em outro lugar.
Protagonistas – Algum outro detalhe?
MTroyjo – Nós fizemos um grupo de estudo que ficou seis meses debruçado sobre o projeto, com o objetivo de propor essas mudanças. E agora vamos anunciá-las e implementá-las.
Protagonistas – E em relação à Gazeta Mercantil?
MTroyjo – Na Gazeta, como se sabe, estudamos muito o modelo da reforma do Wall Street Journal e estamos implementando mudanças progressivamente. Elas começaram com esse novo formato em abril do ano passado. Também criamos novas editorias, passamos a contar com a Ângela Bittencourt escrevendo regularmente. O jornal hoje publica entre dez e 12 artigos de opinião por dia. Fizemos a pulverização da editoria de opinião, de tal modo que todas as editorias passassem a ter artigos de opinião, melhorando, desse modo, a oxigenação do jornal com a sociedade. E hoje temos aqui efetivamente uma vaquinha de dar leite. Lançamos esse BIG, um jornal com a mesma filosofia do New York Times Digest, que hoje segue diariamente para 120 mil destinos, de língua inglesa e de língua espanhola.
Nélson Tanure – A propósito, como que vai o BIG?
MTroyjo – Vai bem. Nós agora vamos estrear a versão semanal em chinês-mandarim, provavelmente no início de fevereiro. Temos já as versões semanais em árabe e francês. Isso é um diferencial importante. O BIG é o primeiro jornal feito por brasileiros, sobre o Brasil, voltado para diferentes mercados, nos idiomas de origem.
Protagonistas – Eu gostaria que o senhor comentasse um pouco o cenário da mídia impressa, que demonstra, no caso dos jornais, uma tendência histórica de queda de circulação.
Nélson Tanure – Nós entramos numa atividade chamada multimídia. E a nossa empresa se chama Companhia Brasileira de Multimídia. E mídia é, como a própria palavra diz, meio. Ela é um veículo. Nós temos hoje duas marcas que são no fundo quality papers, tanto a Gazeta Mercantil quanto o Jornal do Brasil. São jornais que não disputam o mercado popular, onde estão os títulos de tiragens elevadas. Por isso sofremos menos nessa questão da circulação. Até porque o público da classe AAA é diferenciado. Fora isso, estamos investindo muito no mundo digital, com o InvestNews e com o JB Online, o primeiro jornal eletrônico brasileiro, além do BIG, que é um jornal em várias línguas.
“Eu diria que ele (JB) será um jornal que vai se aprofundar em algumas coisas que no nosso entender são relevantes.”
Protagonistas – O Augusto disse, ao assumir, que um dos objetivos da ida dele para a Direção de Jornalismo da Editora JB seria a de contribuir para qualificar o conteúdo do JB e que o jornal será mais seletivo e aprofundado, ou seja, não quer dar tudo, mas tudo o que der, pretende dar bem. Coincide um pouco com essa visão…
Nélson Tanure– Eu diria que ele será um jornal que vai se aprofundar em algumas coisas que no nosso entender são relevantes.
Protagonistas – Isso em função basicamente do perfil do leitor?
Nélson Tanure – Sim e esse é outro paradigma pelo qual me bato: todo o respeito ao leitor. No momento em que é feita uma matéria mentirosa, ali tem um grande perdedor: o leitor. Aquela matéria é um desrespeito ao leitor. Temos que respeitar o cara que mete a mão no bolso e tira dois reais para ler o nosso jornal. Esse cara merece respeito.
Protagonistas – Como está a circulação dos jornais?
MTroyjo – A Gazeta Mercantil tem uma tiragem de 80 mil exemplares, com 75 mil assinantes. O Jornal do Brasil também tira 80 mil, sendo 60 mil assinantes e 20 mil bancas. Nos domingos essa tiragem cresce para aproximadamente 100 mil exemplares.
Nélson Tanure – Veja bem, são 75 mil pagantes na Gazeta Mercantil e 60 mil no JB. Circulação paga!
Protagonistas – O que está pensando para 2006?
Nélson Tanure – Vamos ousar esse ano, mas não queremos sair da classe AAA. Nosso objetivo é crescer dentro desse nicho. Temos já uma bela circulação em Brasília, onde somos muito lidos e respeitados. Lançamos, no JB, os cadernos diários regionais, um grande sucesso. Já temos Brasília, Barra e Niterói. Este, aliás, é um instrumento interessante por permitir levar informações do bairro, da cidade, para a própria comunidade. Inclusive são impressos lá, pelo mesmo sistema da Gazeta Mercantil. O que acontece é o seguinte: em Brasília, o JB de Brasília pode ser diferente do JB do Rio. A primeira página, por exemplo, pode ser diferente numa cidade e na outra.
Protagonistas – E a Forbes?
Nélson Tanure – A Forbes é uma revista de qualidade, de pequena circulação.
Protagonistas – E como estão as brigas? As negociações?
Nélson Tanure – Não tem briga nenhuma.
Protagonistas – Falo do rompimento com o grupo anterior.
Nélson Tanure – Teve aquela coisa com o Thompson (NR: Sérgio Thompson Flores trabalhou com Tanure por uma temporada e lá dirigiu a Forbes, até surgir um desentendimento que os colocou em lados opostos. Houve briga pela marca, mas Tanure venceu e Thompson Flores fundou a Foco – Economia e Negócios), mas continuamos com a operação, embora ela seja pequena.
Protagonistas – E o senhor pretende continuar com ela?
Nélson Tanure – Pretendo, pretendo. Mas ela não tem nenhuma expressão. O faturamento dela, anual, é pequeno.
Protagonistas – Vale como uma aposta no futuro?
Nélson Tanure – Vale como uma aposta na marca, porque nós estamos fazendo muitos seminários, muitos eventos, muitas mesas redondas, muitos encontros do mundo empresarial. Aí vale muito a pena.
MTroyjo – Nós temos uma empresa da Forbes voltada para mulheres profissionais, que é uma referência no mercado, aqui no Brasil.
Nélson Tanure – Esse mercado de eventos, hoje, está sendo muito explorado no mundo por companhias de mídias, que passaram a organizar cursos pra executivos, premiações dos melhores, seminários etc.
Protagonistas – Muito obrigado.
Nélson Tanure – Permanecemos à disposição.
Fonte: Jornalistas & Cia