As ruínas da UFRJ: estudo mostra que metade dos prédios da universidade precisa de obras

Uma das mais conceituadas e antigas instituições de ensino superior do país, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) enfrenta uma grave crise em seus campus, com prédios cheios de rachaduras e vazamentos. Uma inspeção feita em 77 prédios — metade do total de imóveis — mostrou que o estado de conservação de 18 deles é considerados “muito ruim”, exigindo obras imediatas “para restaurar sua segurança”. Em 80% desses, há risco de incêndios ou desabamentos. A recuperação desse patrimônio, de acordo com a universidade, custaria R$ 790 milhões — o equivalente a todo o investimento previsto no orçamento do Ministério da Educação para a rede federal este ano. Somente para os reparos emergenciais, com prioridade máxima, a reitoria calcula um gasto de R$ 570 milhões.

— Os engenheiros avaliaram que 52% dos prédios da UFRJ necessitam de obras de reparo, sendo 32% de uma recuperação profunda. O que precisamos agora é que a universidade continue funcionando. Ela não vai fechar, porque a gente começa a cortar um monte de coisa — afirmou o reitor da UFRJ, Roberto Medronho.

O orçamento de custeio repassado à UFRJ caiu de R$ 689 milhões, em 2014, para R$ 392 milhões, este ano. Segundo Medrono, R$ 109 milhões já estão comprometidos com pagamentos fixos. O restante é para manutenção e reformas. A universidade está ainda as contas de água, luz e telefone atrasadas, algumas há três meses.

A degradação da infraestrutura tem afetado até mesmo a qualidade acadêmica já que a falta de manutenção provoca, vez ou outra, a suspensão de aulas e outras atividades. No último dia 2, a queda de um muro do ginásio da Escola de Educação Física e Desportos, no campus da Ilha do Fundão, assustou os mais de 2,5 mil alunos e os funcionários.

Os casos mais críticos na avaliação da equipe de Patrimônio Imobiliário da UFRJ são os de prédios do Centro de Letras e Artes, do Centro de Ciências da Saúde, do Centro de Filosofia Ciências Humanas e do Edifício Jorge Machado Moreira (antigo prédio da reitoria), que abriga a Escola de Belas Artes e a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, todos no Fundão. Na Praia Vermelha, preocupam as condições do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas.

Tombamento encarece

Doze dos 18 prédios em estado crítico são tombados, o que dificulta e encarece ainda mais as obras de recuperação. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) fiscaliza a preservação do Instituto de Atenção à Saúde São Francisco de Assis; do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS); da Escola de Enfermagem Anna Nery — os três no Centro —; e do Palácio Universitário, no campus da Praia Vermelha. Outro agravante é que parte dos prédio foi construída entre as décadas de 1850 e 1960. O Iphan informou que a conservação de imóveis tombados é de responsabilidade de seus proprietários e que cabe ao instituto orientar os gestores para “evitar ações que possam danificar as edificações”.

Como solução, a universidade vem buscando firmar parcerias público-privadas, para arrecadar recursos. No ano passado, a prefeitura do Rio ofereceu R$ 2 milhões para refomar a fachada do IFCS, mas o projeto foi embargado pelo Iphan “por problemas técnicos”.

— Eu virei pedinte. Estou dialogando com o governo do estado e com a prefeitura, para buscar parcerias em que a gente possa oferecer nossa expertise para resolver problemas do Rio e eles entrem com o investimento — disse Medronho.

O Conselho Universitário da UFRJ chegou a enviar em março deste ano uma carta a parlamentares pedindo “saídas emergenciais” para a situação orçamentária da instituição. No X (antigo Twitter), o ministro da Educação, Camilo Santana, escreveu que “já estão disponíveis R$ 347 milhões para suplemento de custeio das nossas instituições, honrando o compromisso que assumimos com toda a sociedade”. Em nota, o ministério informou que “a dotação atualizada de todas as fontes para a UFRJ, excetuando-se pessoal, é de R$ 430,5 milhões”. Acrescentou que “as instituições têm total liberdade para definir suas prioridades internas, incluindo a alocação de recursos, a gestão de contratos terceirizados e a execução de projetos, conforme suas necessidades e diretrizes institucionais”.

— A UFRJ sempre esteve à frente de seu tempo. Foi inovadora em diversos aspectos, e a primeira faculdade brasileira a estar entre as 12 melhores do mundo. Vê-la definhar desse jeito é realmente muito triste. Tenho orgulho de fazer parte dessa instituição. Espero realmente que as próximas gerações de gestores e governantes se preocupem em manter esse patrimônio histórico e acadêmico — disse o estudante de Engenharia Lucas Messini Almeida, de 25 anos.

Por dia, cerca de cem mil pessoas circulam pelas unidades da UFRJ — que incluem 1.456 laboratórios, 44 bibliotecas, nove unidades de saúde e o parque tecnológico de 350 mil metros quadrados com startups. Fazem parte do patrimônio da universidade, por exemplo, o Museu Nacional (que está em obras desde o incêndio em 2018), o Hospital Clementino Fraga Filho, na Ilha do Fundão, e o antigo Canecão, que está sendo concedido à iniciativa privada.

— A faculdade precisa se manter de pé. Os alunos e os professores estão empenhados em lutar pela sobrevivência da UFRJ. Ela é importante demais para o Estado do Rio e o país. É preciso fazer uma intervenção de emergência para evitar que tragédias como as que já vimos aconteçam novamente — afirmou a estudante da Faculdade de Letras Letícia Maria Jordan, de 20 anos.

Patrimônio em chamas

Na última década, a falta de manutenção foi responsável por desastres em prédios da universidade, como o incêndio no Museu Nacional. Em 2011, o fogo também atingiu o oitavo andar do edifício Jorge Machado Moreira, antigo prédio da reitoria. Hoje, o edifício, que é tombado pelo município, está com 80% da sua edificação comprometida, correndo risco de desabamento.

— Um novo incêndio na Letras destruiria a maior biblioteca na área do país, com obras raras, como a primeira edição de “Os Lusíadas” e acervos pessoais completos de ícones como o gramático Celso Cunha e o literato Afrânio Coutinho — disse o professor Afrânio Gonçalves Barbosa, decano do Centro de Letras e Artes.

A universidade não tem recursos para manter seus prédio, ainda mais fazer novos. Em 2012, a UFRJ começou a construir quatro edifícios para as faculdades de Letras e Economia e para o Centro de Filosofia e Ciências Humanas, no Fundão. Doze anos depois, a obra segue parada, ainda no esqueleto.

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