Empresas com licença para mães não gestantes LGBTQIA+ se destacam no mercado

Maria Eduarda Lavocat

A licença-maternidade é um direito concedido às mulheres trabalhadoras que se tornam mães, permitindo que elas se afastem do trabalho por um período determinado para cuidar de seus filhos recém-nascidos. De acordo com a legislação brasileira, a licença mínima é de 120 dias corridos, podendo ser ampliada para 180 dias nas instituições que aderiram ao programa Empresa Cidadã. Em março de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a licença-maternidade deve ser igual para mães biológicas e adotantes, um marco para garantir a igualdade de direitos. No entanto, ainda há um debate no caso de mães não gestantes de casais homoafetivos, nos quais apenas uma das mulheres faz a gestação do bebê.

Diante disso, empresas foram pioneiras ao adotar políticas de inclusão e diversidade voltadas para essas mulheres no Brasil, como a Pipo Saúde e a Petrobras, ganhadora do Prêmio Think Work Innovations na categoria remuneração e benefícios neste ano. Segundo Mariana Dias, CEO da empresa Gupy, estruturar a licença-maternidade de forma adequada não só apoia a mãe e o bebê durante um período crucial de suas vidas, como também reflete valores importantes de responsabilidade social com as pessoas que fazem parte da empresa. “É importante ressaltar que a cultura corporativa é um fator superimportante para ajudar a acolher essas mães durante esses momentos de mudança, garantindo que esse afastamento temporário não prejudique a carreira ou o potencial dessa mulher. Então, adotar políticas inclusivas como a licença-maternidade, como Empresa Cidadã, com certeza influencia a competitividade, impactando diretamente não só a atração, mas também a retenção de ótimos talentos”, afirma Dias.

Em 13 de março deste ano, o STF tomou mais uma decisão relacionada a essa causa. Segundo a advogada Bianca Bonfim Carelli, especialista em direito parental e parceira da Filhos no Currículo, “em relação a casais homoafetivos, quando a mãe gestante não tiver direito à licença-maternidade, a mãe não gestante poderá fazer uso da licença-maternidade. No entanto, quando a mãe gestante tiver direito à licença-maternidade por ser servidora pública ou seletista, ou fizer recolhimento para a Previdência, ela terá acesso à licença-maternidade, e a mãe não gestante, nesse caso, fará jus ao período equivalente ao período de licença-paternidade”.

O parecer representa mais um avanço na igualdade, mas seria essa divisão de licenças a ideal? Algumas progenitoras que vivem essa realidade afirmam que essa não é a solução, pois, apesar de não terem realizado a gestação, elas não deixam de ser mães. “Acho que é fundamental considerar a licença-maternidade para todas as mães, independentemente do tipo de relação. Quando soube que teria direito a apenas cinco dias de licença porque não sou a mãe gestante, fiquei profundamente reflexiva e desesperada”, conta Anne Werlang, 32 anos, casada com Lorrany Werlang, 27, mães do Bento.

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“O tempo de contato com a criança é muito importante para criar um vínculo. Independentemente de qualquer coisa, eu nasci e cresci me preparando para ser mãe. Eu não sabia que me relacionaria com uma mulher, mas, desde criança, sempre quis ser mãe. Então, independentemente de ter gestado ou não meu filho, minha preparação, meu psicológico, meu desejo de ser mãe continuaram. Esse vínculo de mãe e filho que precisamos construir é formado nesse primeiro momento, nos primeiros meses”, completa Anne.

Durante a gestação, o casal teve sorte devido à decisão do STF mencionada. “Como a Anne trabalha como professora em duas escolas particulares, e eu não tenho carteira assinada, optamos para que a licença fosse para a Anne. Apesar de a decisão do STF não ser uma lei, ela deu embasamento para que nós pudéssemos reivindicar nossos direitos. Assim, conseguimos que as duas escolas beneficiassem a Anne com a licença-maternidade”, detalha Lorrany.

Pensando nessa necessidade, a Petrobras passou a garantir que, em casais homoafetivos formados por mulheres, ambas as mães tenham direito a uma licença remunerada de 120 dias. A primeira licença desse tipo foi concedida pela empresa em setembro e, a partir de novembro de 2023, o benefício foi oficialmente adotado como uma política permanente da empresa. Até o momento, duas funcionárias e suas respectivas companheiras foram beneficiadas por essa nova política. Enquanto as companheiras receberam a licença-maternidade padrão em seus locais de trabalho, as funcionárias da Petrobras puderam desfrutar do mesmo período ao lado do novo bebê, com o salário integralmente pago. A concessão do benefício exige a apresentação de documentação que comprove a maternidade, como comprovante de adoção ou certidão de nascimento com o nome de ambas as mães no registro.

“Esse processo foi muito bonito porque nasceu de demandas internas. Desde 2017, começamos a nos deparar com situações em que as companheiras de nossas empregadas engravidavam e seguiam com a gestação, tornando nossas empregadas as mães não gestantes. Inicialmente, oferecíamos a licença equivalente à paternidade, mas isso nos incomodava, pois envolvia questões de identidade e reconhecimento da maternidade, que é um tema cheio de camadas e nuances. Com o tempo, entendemos que as mulheres nessas situações são mães, não pais, e que a maternidade traz questões específicas que influenciam a relação com o trabalho”, conta Tiana Ellwanger, gerente de cultura, clima e diversidade do RH da Petrobras. Por conta da iniciativa, a empresa ganhou o Prêmio Think Work Innovations na categoria remuneração e benefícios neste ano.

Além da Petrobras, a corretora Pipo Saúde adotou uma política semelhante como forma de promover igualdade na empresa. “Temos uma licença igual para mães gestantes, mães não gestantes e pais de filhos por gestação ou adoção. A licença é de cinco meses integrais, ou a pessoa pode optar por quatro meses integrais mais dois meses com horário reduzido, em meio período. A licença pode ser tirada logo no momento do nascimento do bebê ou até a criança completar 1 ano de vida, podendo ser usufruída de forma contínua ou parcelada, conforme a necessidade da família”, explica Marcela Ziliotto, head de pessoas da Pipo.

“O que nos motivou a implementar essa política é que, hoje, 24% da empresa é composta por pessoas do grupo LGBTQIA+. Isso foi um grande motivador, pois acreditamos que, para igualar as oportunidades de desenvolvimento de carreira dentro da empresa, as condições para aqueles que têm um bebê devem ser as mesmas para todos. Além disso, acreditamos que essa política tem um impacto social importante ao apoiar a criação das crianças e a divisão das responsabilidades familiares, gerando impacto tanto na sociedade quanto dentro da nossa empresa”, completa Ziliotto.

Tiana Ellwanger também ressalta que compreendeu na prática como essas políticas são importantes. “Para ser sincera, eu não tinha essa dimensão no começo. Estou nessa área desde que entrei aqui como júnior, mas antes eu trabalhava em uma área focada em atração e experiência de novos empregados. Lembro de uma conversa com uma nova empregada que mencionou que a licença-maternidade para mães não gestantes foi um fator decisivo para ela vir para a Petrobras. Isso me tocou muito, pois mostra que benefícios como esse realmente fazem a diferença na atração e retenção de talentos, especialmente em carreiras onde há menos mulheres.”

A head da Pipo Saúde, Marcela Ziliotto, completa: “Acho muito importante que essas políticas sejam públicas e publicadas no site das empresas, para que candidatos e candidatas possam entender o posicionamento da empresa. A partir do momento em que a empresa institucionaliza uma política como essa, ela está se posicionando e mostrando o que acredita ser importante. Além disso, a empresa está afirmando que, dentro dela, pessoas com diferentes características, sejam mães gestantes, mães não gestantes ou pais, terão oportunidades equalizadas e iguais, independentemente desses fatores”.


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