MP que pode render R$ 35 bi a Haddad trava após resistência no Senado; governo tenta novo acordo

A principal medida de arrecadação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, neste fim de ano, que pode render até R$ 35 bilhões em 2024, travou no Senado Federal após resistência de parlamentares. Um novo acordo está sendo costurado para tentar levar o texto a votação nesta quarta-feira, mas ainda depende de aval do ministro da Fazenda. A medida provisória aumenta a tributação de impostos federais para empresas que têm benefícios de ICMS para custeio.

O principal entrave é a tributação do montante de impostos não pagos no passado, que o governo entende como dívidas.

A matéria traz atualmente um desconto de 80% sobre esse valor, o que foi acordado entre governo e parlamentares na Comissão Mista de análise da Subvenção do ICMS. Mas senadores, incluindo da base de governo, permaneceram contrários à proposta. Duas opções foram citadas como alternativas e serão levadas a Fernando Haddad pelo líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).

Uma delas seria o governo se comprometer a enviar um projeto de lei, após a aprovação da MP, para zerar a cobrança sobre os retroativos. Outra opção mencionada seria manter o desconto de 80%, mas para um prazo de 5 anos. Hoje, o limite para esse redução está limitado a um pagamento dentro do prazo de um ano.

Não ficou claro, porém, se a segunda opção também viria por projeto de lei ou poderia ser uma modificação da medida provisória via destaque supressivo.

— A matéria foi aprovada, eu diria até, com muita tranquilidade na Câmara, por mais de 340 votos. É evidente que o Senado é uma casa com outro tipo de composição. A gente até tinha número, mas tinha um número apertado. Como sei o quão importante é essa medida provisória, eu prefiro, se possível, não correr risco. Eu não prometi nada. Eu disse apenas que a gente ia elevar a demanda — disse Jaques Wagner.

O senador Weverton Rocha (PDT-MA) acredita que o Ministério da Fazenda vai resistir ao desconto de 100% para os estoques das dívidas, já que abrir mão dos 20% de pagamento poderia ter um impacto na estimativa de arrecadação.

– Haddad está resistindo porque acha que já tem votos. Passa, mas apertado. Esses 20% podem custar 18 bilhões ao governo – afirmou.

Entenda a MP

A proposta é uma medida provisória (MP) que aumenta a tributação federal sobre empresas que têm benefícios de ICMS para custeio (despesas do dia a dia).

A MP pode render mais de R$ 35 bilhões aos cofres da União, recursos que vão ajudar o governo a cumprir a meta de zerar o déficit nas contas públicas no ano que vem. O texto, no entanto, foi bastante desidratado em relação à proposta original. Mas, mesmo com mudanças, a Fazenda mantém essa previsão, de acordo com o próprio Haddad.

Técnicos da Fazenda afirmam que a estimativa de R$ 35 bilhões permanece porque a cobrança incidirá sobre as receitas futuras, com a renegociação abrangendo apenas o que deixou de ser pago nos últimos seis anos.

O ICMS é um imposto estadual. Hoje, empresas que têm incentivos de ICMS acabam também pagando menos impostos federais porque a base de cálculo desses tributos é reduzida. Na prática, é como se o benefício estadual passasse a ser também federal.

JCP: abaixo dos R$ 10 bi

A partir da aprovação final da MP, as empresas voltarão a pagar os impostos federais — CSLL e PIS/Cofins — sobre investimentos e custeio integralmente, como se não houvesse benefício do ICMS. Além disso, será pago o Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) sobre o custeio.

Integrantes do Ministério da Fazenda ressaltam que não se trata de novas cobranças. E afirmam que as empresas que atualmente fazem uso desses benefícios formam um grupo de aproximadamente 300, todas de grande porte e com elevados lucros anuais.

De acordo com o texto, as companhias poderão continuar abatendo apenas 25% do IRPJ sobre custos com investimentos, como compra de maquinário, terrenos e de itens que se depreciem com o tempo. A compra de matéria-prima e a contratação de pessoal serão consideradas custeio e, portanto, taxadas.

O relator da MP, deputado Luiz Fernando Faria (PSD-MG), incluiu no texto empresas de comércio de bens e serviços, como supermercados. Dessa forma, esses setores também poderão pedir crédito tributário de IRPJ sobre os investimentos. Antes o benefício era dado principalmente a indústrias.

O texto do relator também incluiu ainda mudanças no Juro sobre Capital Próprio (JCP), modalidade de distribuição de lucros de acionistas em grandes empresas, que hoje tem dedução de impostos. Inicialmente, a expectativa era de R$ 10 bilhões de ganho com o fim do JCP.

A possibilidade de acabar com o JCP não foi bem aceita pelo mercado. Depois de semanas de negociações, o benefício de dedutibilidade de impostos para investidores e acionistas foi mantido, com apenas algumas restrições.

Integrantes do Ministério da Fazenda afirmam que, com as mudanças, a arrecadação ficará abaixo dos R$ 10 bilhões previstos. Haddad disse que vai propor uma medida, na semana que vem, para compensar a desidratação.

As limitações colocadas pelo relator, em acordo com o governo, são para evitar o planejamento tributário. Na prática, a ideia é garantir que o JCP seja pago apenas em caso de lucro real das empresas, evitando práticas contábeis.


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